O valor universal da água, no que diz respeito à sobrevivência da Humanidade e à importância que tem por exemplo para as questões energéticas e da regeneração do corpo, obriga a que cada um de nós deva tomar esse recurso como finito e o preserve em todas as formas de utilização. As cidades que o têm como recurso económico e identitário devem saber potenciá-lo como desenvolvimento, contribuindo assim para o desígnio universal. Este é um espaço de estas e de outras águas. De todas as águas.

2010-06-27

Chaves

Reproduzimos uma entrevista do Semanário Transmontano, de 4 de Junho passado, sob o título "Transmontanos de gema", dada pelo maestro Ferreira Lobo, que faz algumas considerações à cidade de Chaves que se quer termal. É o olhar de quem ali nasceu e vive fora. Quem gere as cidades deve ter uma atenção particular para quem, de fora, vê a cidade com outra distância, mas sem menor afecto.

“Chaves é a minha terra e eu projecto sobre a minha terra uma série de desejos”

Ferreira Lobo, de 56 anos, vive há muitos anos em Matosinhos

Conserva algum sotaque, não passa sem os salpicões que manda fazer e guarda num pote de azeite, e nunca há-de esquecer o cheiro do avô, com quem dormia, e que ainda tem entranhado. Mas em Chaves também há coisas que lhe desagradam: a degradação do centro histórico, os erros urbanísticos, e ainda a escassa oferta cultural. O flaviense Ferreira Lobo, maestro titular da Orquestra do Norte, já dirigiu espectáculos nas mais conceituadas salas do mundo. No concelho, ainda é um desconhecido. Mas isso não o preocupa. O que o preocupa é o facto de o país não cultivar as tradições culturais.

Semanário Transmontano: Considera-se um transmontano de gema?

Ferreira Lobo: Acho que de uma forma geral, todos os transmontanos e todos os flavienses, em particular, têm uma ligação à terra. Há-de reparar que a geração dos nascidos em 50 quase todos regressaram. Independentemente de vir visitar os meus pais, venho ciclicamente ver um grupo de pessoas com quem partilhei a infância, o liceu e, inclusivamente, a faculdade.

ST: Ainda conserva o sotaque flaviense?

FL: Claro que sim, qualquer flaviense, qualquer autóctone, preserva sempre. Eu tive um professor na faculdade, que apesar de ter saído muito jovem de Bragança, aos 70 anos matinha exactamente o sotaque transmontano cerrado. Eu creio que ele o cultivava.

ST: Sente saudades de Chaves?

FL: Depende do período, mas de tudo. A minha vivência em Chaves foi uma vivência feliz, muito diversificada e que tem a ver com dois territórios: um profundamente rural, do lado do meu pai, e outro urbano, do lado da minha mãe. E esse contacto permitia-me experiências muito diversificadas, enquanto criança.

ST: O que não esquece… imagens, cheiros…

FL: Os cheiros todos. De Chaves e da periferia. O cheiro da batata, das ruas, dos animais e, sobretudo, o cheiro do meu avó, quando dormia com ele. Tenho esse cheiro perfeitamente entranhado.

ST: De que forma mata saudades?

FL: As saudades não se matam. Faço périplos a pé pelo planalto, por Nogueira, onde ainda existem primos. Gosto de me encontrar com pessoas que têm muita idade.

ST: Essas pessoas conhecem-no, têm noção do seu valor artístico?

FL: Não conhecem o meu percurso, nem têm que reconhecer. O valor é sempre relativo e não estou a falar com falsa modéstia, acredito que é assim. Infelizmente, acredito que aquilo que eu faço diz muito da nossa sociedade, não só de Chaves. O núcleo que tem acesso a bens culturais desta natureza continua a ser ainda um núcleo muito restrito. Aquilo que fizemos de bom como trabalho foi ter levado a música erudita a centenas de milhares de pessoas.

ST: Através dos protocolos com as Câmaras…

FL: O relacionamento com as autarquias, acho que foi um trabalho determinante, mas por si só não chega. Mas creio que é um problema que atravessa toda a sociedade portuguesa, na medida em que somos um país que não cultiva estas tradições, mas devia cultivá-las.

ST: Isso entristece-o?

FL: Não fico propriamente triste, é preciso racionalizar a questão. Os países mais desenvolvidos da Europa não são desenvolvidos por acaso. Estas tradições ajudam a que as pessoas tenham pensamentos mais estruturados, que sejam pessoas mais informadas, mais críticas e, como consequência disso, mais organizadas, e isso, naturalmente, reflecte-se na pujança da sua economia. Porque, repare, há países mais pequenos que Portugal, como a Holanda ou a Bélgica, onde a qualidade de vida não tem comparação possível. Falo da Holanda porque estudei lá algum tempo, mas poderia falar dos países bálticos, que são países incomensuravelmente mais à frente em termos culturais e consequentemente mais à frente em termos económicos. Hoje fala-se muito em economia, ora a economia depende da nossa capacidade de resposta aos problemas que se nos colocam no dia-a-dia. E o que é que isso tem a ver com música? A música é um elemento que no período da aprendizagem, da formação, nos pode ajudar a ter um pensamento mais estruturado, com melhores respostas, mais crítico, mais aberto. Aquilo que nos é oferecido em termos de consumo corrente é exactamente o contrário, faz o amortecimento intelectual, psicológico, espiritual. Normalmente, quando se vai à discoteca o que é que se ouve? Ouve-se sons isócronos, sempre batidas da mesma maneira, impedem-nos, por exemplo, de estar a conversar, de interpretar a realidade, limitam as nossas capacidades intelectuais na sua plenitude.

ST: Mas apesar do atraso do país relativamente ao resto da Europa, parece-lhe que Chaves deu um salto desde que saiu daqui?

FL: Acho que tinha que dar. Mas no ponto onde estamos e no edifício onde estamos, veja bem, do ponto de vista arquitectónico, pergunto-me, olhando para este contexto, se evoluímos.

ST: Como vê a cidade?

FL: Vejo uma cidade que evoluiu demograficamente, mas que não evoluiu qualitativamente, no sentido da oferta aos seus cidadãos, no sentido da organização urbanística, por exemplo. Evidentemente que a informação chega, e naturalmente faz com que as pessoas estejam mais despertas, mais curiosas relativamente a um conjunto de processos e que isso, naturalmente, tem que se traduzir em evolução. Mas eu gostaria de ver o contexto histórico da cidade mais preservado, gostaria de ver aqui orquestras sinfónicas mais vezes, não necessariamente a Orquestra do Norte; a actividade cultural mais articulada com o nosso contexto económico, que julgo estará dependente dos serviços, nomeadamente os de excelência de que a cidade dispõe, como é o caso do termalismo. Acho que a articulação de termalismo com cultura faz todo o sentido, mas, para isso, é preciso boas infra-estruturas.

ST: O auditório do Centro Cultural oferece essas condições?

FL: O auditório é um auditório perspectivado para uma escola. Eventualmente, também poderá servir outros propósitos, mas essencialmente serve uma escola, por isso, é sempre uma estrutura com algumas limitações, isto do ponto de vista profissional. Vem a propósito disto dizer que faria sentido devolver à cidade um espaço que tem história, que é o Cine-Teatro, onde muita gente da minha geração e de outras passou lá domingos fantásticos, a ver uns filmes fantásticos.

ST: Quando decidiu que queria ser maestro?

FL: Há uma determinada altura em que a necessidade de um projecto desta natureza se torna evidente, uma motivação de vida, e é aí que decido seguir um projecto aliado a uma determinada capacidade pessoal ligada a esta forma de expressão artística.

ST: Foi influenciado por alguém, no seio da família?

FL: Não, na família, pais, tios e irmãos sempre cantaram, mas para consumo caseiro. São as chamadas canas rachadas, aliás, eu também sou.

ST: Em criança já gostava de bandas filarmónicas?

FL: Ouvia com agrado. O meu passado em Chaves está ligado a bandas e aos conjuntos. Fiz parte do Aquaflaviae.

ST: Tocavam nas festas?

FL: Andávamos em tudo. Mas fazíamos sobretudo os bailes do Liceu. Começávamos com o baile de Santos, a seguir era o baile de gala, depois o Liceu rivalizava com a Escola…

ST: Há algum espectáculo que o tenha marcado especialmente?

FL: Tive alguns. Desde logo em Portugal, alguns ligados a este projecto. Mas devo confessar que sou muito feliz porque tenho muitos. Tive o privilégio de dirigir grandes obras, com muito público e com grande sucesso artístico. Naturalmente, que há momentos interessantes. Não se dirige todos os dias em Praga…dirigir requiem de Mozart em Paris também… são momento únicos.

ST: Tem fama de ser demasiado perfeccionista, teve, aliás, alguns atritos com a Câmara Municipal de Chaves, relacionadas com a falta de condições para a realização dos concertos. Está ultrapassado?

FL: Vejamos, quando sou amigo, ou quando tenho uma relação afectiva, com uma pessoa, tenho tendência a exigir mais dela. Isto pode parecer um contra-senso, mas não é. Chaves é a minha terra e eu projecto sobre a minha terra uma série de desejos. Agora eu acho que, na medida proporcional em que eu projecto desejos, também acontece que eu tenho, ao longo do tempo, me disponibilizado, e sem me pôr em bicos de pés, não faz parte do meu carácter. No entanto, acho que essa disponibilidade, por um lado, não é aproveitada, e, por outro lado, tudo aquilo que eu vou mostrando que deve ser alterado, para benefício do público e até para prestígio das instituições, cai sistematicamente em saco roto. Isso depois cria uma tensão que num determinado momento acaba por explodir.

ST: Mas está ultrapassado ou não?

FL: Eu acho que as coisas se podem fazer melhor. Eu não entro nisto para fazer uma gestão da minha imagem pública. Eu sou um técnico e como técnico sou exigente comigo próprio e com os sistemas que de mim estão dependentes. É a minha postura e por vezes isso faz com que reaja de forma tecnicamente inadequada, devo dizê-lo, ou menos assertiva, porque é a quente, mas penso que sempre que reagi tinha razão.

ST: Mudando de assunto, no prato, é transmontano?

FL: Estão a perguntar se sou bom garfo? Sim, é verdade.

Tenho uma senhora que me faz salpicões todos os anos e que eu guardo num pote de azeite. Lembro-me assim de alguns cozinhados da minha mãe e que eu tento imitar de forma grosseira de vez em quando. Sim, sou um apreciador dos sabores transmontanos.

ST: Como definiria um transmontano de gema?

FL: Transmontano de gema… bem, eu não sei se há transmontanos de gema. Não é propriamente uma definição. É aquele que gosta da sua terra porque tem um conjunto de afinidades, mais ou menos primárias, mais ou menos sensitivas, e que tem que ver com os seus laços. É, sobretudo, aquele que não nega que nasceu nas berças.

Por: Margarida Luzio

2010-06-21

Águas Turvas (5): a Caça às Baleias

Tenho recebido o apelo de amigos sobre este tema. Já subscrevi a petição.
A Comissão Baleeira Internacional (CBI) iniciou nesta segunda-feira as suas reuniões em Agadir (Marrocos), com o objetivo de chegar a um acordo entre partidários e críticos da caça, entre acusações de ter motivações mais políticas do que ambientais.
Esta 62.ª sessão da CBI (criada, em 1946, para regular a caça às baleias) examinará até sexta-feira um projecto de acordo, para pôr um ponto final a 25 anos de conflito entre seus 88 membros, que têm desentendimentos desde a entrada em vigor, em 1986, da moratória à caça.
A proposta prevê reduzir o número de capturas para os próximos dez anos, o que significa autorizar a pesca comercial. O texto não determina, porém, o que ocorrerá quando esse período interino for concluído.
Noruega e Islândia (que criticam a moratória) e Japão (que também apoia o seu fim no caso de caça para pesquisa científica) capturaram mais de 1.500 baleias no ano passado, das quais 1.000 corresponderam apenas ao Japão, segundo cotas que o próprio país se concedeu. A negociação passa, pelos vistos, por impedir a caça nos santuários de baleias, criadas no Oceano Índico e no Austral, mas quanto ao resto tudo está no campo das hipóteses.
Antes da votação final, membros da Avaaz querem chegar a 1 milhão de assinaturas. Clique para assinar e depois reencaminhe este e-mail:
https://secure.avaaz.org/po/whales_last_push/?vl
Graças a um chamado global, muitos governos já se comprometeram a irem contra a proposta. Cada vez que a petição da Avaaz ganhou 100.000 nomes, ela foi enviada para a CBI e governos-chave. Alguns destes, como a Nova Zelândia, agradeceram.
Mas a pressão do outro lado é incansável. Outros governos, especialmente na Europa e América Latina, podem abster-se, ou até mesmo apoiar a proposta. Portanto, o resultado da votação é ainda incerto.
E mais:
Três países querem "levar" baleias para a mesa e para o armário da farmácia:
http://ecosfera.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1441992
Japão ameaça deixar Comissão Baleeira Internacional:
http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,japao-ameaca-deixar-comissao-baleeira-internacional,567025,0.htm
Ambientalistas pressionam Japão para não caçar baleias:
http://www..estadao.com.br/estadaodehoje/20100617/not_imp567722,0.php

O Maior Reservatório de Água

Há semanas que a notícia circulava em todo o mundo. O maior reservatório mundial de água subterrânea foi encontrado na região Norte do Brasil, segundo investigadores da Universidade Federal do Pará.
De acordo com estes especialistas, a reserva do Aquífero Alter do Chão (na imagem, a rosa escuro) é mais significativa que o próprio Aquífero Guarani, até então considerado o mais importante recurso hídrico descoberto no Brasil e na América do Sul. A extensão superficial do Aquífero Guarani (1,1 milhão de quilómetros quadrados) é maior que a do Alter do Chão (ainda sem dados precisos), mas as espessuras do segundo são mais representativas, o que resultará em maior volume de água, talvez superior a 86.000 quilómetros cúbicos. De acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente brasileiro, a reserva do Guarani está calculada em 30 mil quilómetros cúbicos.
Esta descoberta representa um potencial estratégico de água para o Brasil e para a Humanidade.

2010-06-20

Um Mar de Gente

A nossa última homenagem a José Saramago, hoje, há uma hora, no cemitério do Alto de S. João.
"Fisicamente, habitamos um espaço, mas, sentimentalmente, somos habitados por uma memória"
(José Saramago)

2010-06-18

O Dia da Morte de Saramago

José Saramago morreu, hoje, na ilha de Lanzarote. Ilha em que a água é escassa lá dentro e vasta no extenso oceano que a rodeia e prendeu o olhar do escritor. A menos de uma hora da sua morte, estas foram as últimas palavras escritas no seu blogue "Outros Cadernos de Saramago":

Pensar, pensar
Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de refexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, não vamos a parte nenhuma (in http://caderno.josesaramago.org/2010/06/18/pensar-pensar/).

"Caldas da Rainha: Cidadãos apelam ao Ministério da Saúde para não permitir separação do Parque e Mata do Hospital Termal"

Datada de ontem, nota de imprensa acerca da Carta Aberta, retirada da página electrónica da Agência Lusa:

Caldas da Rainha, Leiria, 17 jun (Lusa) – Uma carta aberta apelando à não separação do Parque e da Mata do Hospital Termal das Caldas da Rainha foi hoje entregue na Assembleia da República por um grupo de cidadãos preocupados com a defesa daqueles espaços.
“É crucial que este vasto espaço verde continue a ser reserva ambiental e a servir a salvaguarda dos recursos aquíferos e o funcionamento das termas, como fator competitivo da cidade e do termalismo local e nacional”, disse hoje à agência Lusa Jorge Mangorrinha, ex vereador da câmara das Caldas da Rainha e primeiro subscritor da carta entregue hoje na Assembleia da República.
O documento é dirigido aos primeiros deputados eleitos e em funções das listas do círculo de Leiria, designadamente, José Miguel Medeiros (PS), Teresa Morais (PSD), Assunção Cristas (CDS/PP), Heitor de Sousa (BE), e ainda o líder da bancada do PCP, Bernardino Soares, e a deputada de Os Verdes, Heloísa Apolónia.
Os 15 subscritores defendem no documento que se Caldas da Rainha “possui, ainda hoje, o maior espaço verde em centro urbano histórico de todas as cidades portuguesas” deve-o ao termalismo e ao Estado.
A carta aberta recorda a fundação da cidade formada em torno do mais antigo Hospital Termal do mundo, fundado em 1485.
O estabelecimento de áreas verdes de enquadramento e proteção dos recursos aquíferos termais, anterior ao reinado de D. João V e a construção, no século XIX, do Passeio da Copa e do Parque D. Carlos I, mantiveram o Parque e Mata como “os principais espaços da ritualização dos aquistas das termas”.
O documento surge numa altura em que se aguarda que o Ministério da Saúde revele os resultados de um estudo que deverá indicar soluções para o relançamento do termalismo.
A abertura da atividade termal à iniciativa privada e a eventual alienação de parte do património termal são algumas das medidas defendidas pela autarquia local.
Os autores da carta não contestam a “futura participação da iniciativa privada na reabilitação e gestão de parte do restante património construído, para efeitos de regeneração do termalismo local”, mas alertam que “separar a Mata e o Parque das Caldas do Hospital Termal é destruir um trajeto de mais de cinco séculos de história” e “pôr em risco uma área vital, a ser protegida e valorizada”.
Assim, solicitam ao Ministério da Saúde que “este Património não seja desagregado, mantendo a Mata Rainha D. Leonor, o Parque D. Carlos I e o Hospital Termal como unidade funcional, estética e simbólica, sob uma mesma gestão”.

2010-06-16

O Silêncio das Águas

Nesta noite de terça-feira, assisti ao filme O Mundo do Silêncio (Le Monde du Silence, Itália/França, 1956), no âmbito do Ciclo de Cinema & Ambiente Gulbenkian-Cinemateca, exibido na Sala Félix Ribeiro da Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema.
Este documentário foi para mim muito sofrível.
A vida silenciosa e luxuriante dos oceanos é mostrada pelas lentes de Jacques-Yves Cousteau e Louis Malle e deriva do livro publicado por Cousteau em 1953, The Silent World: A Story of Undersea Discovery and Adventure. Trata-se de um dos primeiros filmes a usarem imagens subaquáticas, a cores, e foi filmado a partir do Calypso, no Mar Mediterrânico, no Golfo Pérsico, no Mar Vermelho e no Oceano Índico. Apesar de premiado, esta primeira experiência cinematográfica do público com o mundo da vida subaquática é para mim um falhanço em termos da mensagem científica, ou melhor ausente, já que as imagens mostradas de morte provocadas pelos homens de Cousteau são o sinal de outras coisas que se dizem deste homem dos mares. Algumas cenas são particularmente criticáveis, embora se diga que se trata de um filme cuja visão da Natureza é anterior aos debates ecologistas e à protecção das espécies marinhas. Mas se Malle era um jovem estudante de cinema Cousteau já estava na casa dos 40.
Enfim, nesta noite, preferi o jantar nos Tibetanos, na mesma companhia de Helena e António.

2010-06-14

Carta Aberta pela Defesa da Mata e do Parque das Caldas da Rainha. Património Secular do Termalismo e do Hospital Termal.

Caldas da Rainha possui, ainda hoje, o maior espaço verde em centro urbano histórico de todas as cidades portuguesas, e deve-o à secular actividade do Termalismo e da Administração Central do Estado Português. A partir do final do século XV, Caldas da Rainha formou-se em torno do seu complexo hospitalar, e a reserva por parte do Hospital de terrenos arborizados ou destinados ao cultivo de vinha e de produtos horto-frutícolas bloqueou, desde logo, o crescimento urbano nessas direcções.
No século XVIII, a “refundação” deste Hospital, através das obras promovidas pelo rei D. João V, manteve as áreas verdes de enquadramento e protecção dos recursos aquíferos termais, acção consequente e reforçada no final do século XIX, quando a Administração Hospitalar, com o financiamento do Governo, fez do Passeio da Copa um grande Parque, implantado numa faixa de terreno do Hospital.
Desde esse período, a Mata e o Parque têm sido os principais espaços da ritualização dos aquistas das termas, incluindo neles os antigos e mais recentes edifícios complementares à prática termal e fundamentais para construir um cenário capaz de proporcionar o estado de repouso, convivência e diversão. Estas duas grandes áreas verdes do Termalismo local e da Cidade são lugares onde o aquista estabelece o contacto com a Natureza, o lazer, o silêncio e a celebração, após o seu contacto íntimo com as águas. Mas, também, a Mata e o Parque sempre foram de entrada franca, permitindo a sua apropriação pelos usos urbanos e pela população em geral.
Estas características fazem deste conjunto um exemplo importante no contexto das cidades termais europeias e singular pelas suas características históricas associadas ao particularismo da História do seu Hospital Termal, fundado em 1485, o primeiro e mais antigo do mundo, no qual, desde sempre, o Governo do País soube manter como seu todo este Património.
Mesmo considerando a futura participação da iniciativa privada na reabilitação e gestão de parte do restante património construído para efeitos de regeneração do Termalismo local, os subscritores desta Carta Aberta solicitam ao Ministério da Saúde que este Património não seja desagregado, mantendo a Mata Rainha D. Leonor, o Parque D. Carlos I e o Hospital Termal como unidade funcional, estética e simbólica, sob uma mesma gestão.
Separar a Mata e o Parque das Caldas do Hospital Termal é destruir um trajecto de mais de cinco séculos de História, é pôr em risco uma área vital, a ser protegida e valorizada necessariamente numa lógica de integração multidisciplinar, como zona de lazer e de saúde e local diversificado de convívio.

Jorge Mangorrinha . António Eloy . Arnaldo Rocha . Eugénio Sequeira . Fernando Catarino . Helena Gonçalves Pinto . João Caldeira Cabral . José Charters Monteiro . José Sancho Silva . Madalena Braz Teixeira . Maria Helena Portugal . Nuno Valadas . Paulo Aguiar . Paulo Ferreira Borges . Victor Valente dos Santos

(Carta Aberta editada, hoje, no jornal Público, na p.23 da edição impressa e em http://jornal.publico.pt/noticia/14-06-2010/carta-aberta-pela-defesa-da-mata-e-do-parque-das-caldas-da-rainha-patrimonio-secular-do-termalismo-e-do-hospital-termal-19607120.htm)

2010-06-09

Águas Turvas (4): o Hospital Oeste Norte e as Caldas da Rainha

Imagem: Vista aérea do actual Centro Hospitalar Oeste Norte (Caldas da Rainha), junto à Mata Rainha D. Leonor (in www.panoramio.com/photo)

Surgiram hoje as primeiras notícias daquilo que se falava desde sexta-feira passada: a ministra da Saúde deu o dito por não dito e negou aos autarcas do Oeste a construção do novo Hospital Oeste Norte. A opção passa pela absurda ampliação do Hospital das Caldas da Rainha, localizado a nascente do Hospital Termal, junto da Mata Rainha D. Leonor, no centro da cidade.
Esta solução e as remodelações dos hospitais de Alcobaça e Peniche acabam por se não distinguirem financeiramente, a médio prazo, da construção de um novo edifício em localização mais adequada de acordo com os princípios que regem o planeamento hospitalar em todo o mundo civilizado. E, pior, nas Caldas ir-se-á sacrificar ainda mais a zona da Mata, com cortes e impactes paisagísticos.
Cumulativamente, o presidente da Câmara das Caldas esfrega as mãos de satisfação sobre a provável entrega do Parque e da Mata à sua gestão, por parte do Ministério da Saúde. Se esta solução for concretizada, haverá pela primeira vez na história deste conjunto um corte na gestão integral por parte de uma só entidade de todo o património termal. A juntar a esta evidência, o mais grave passa por sabermos que a vontade da Câmara das Caldas nunca foi criar e gerir espaços verdes e que os exemplos que tem dado são de um profundo desleixo. Mesmo quando exerci as funções de vereador num mandato, as minhas dificuldades foram imensas para fazer passar algumas ideias e propostas de cariz ambiental.
A Câmara Municipal das Caldas da Rainha tem sido um exemplo devastador do património local, por aquilo que não promove em termos qualitativos e por aquilo que de medíocre deixa fazer.
A Câmara Municipal das Caldas da Rainha quis, em tempos, cortar a Mata com a construção de uma via circular urbana e tem nela tentado construir equipamentos municipais, em vez de os fazer surgir em terreno seu.
A Câmara Municipal das Caldas da Rainha nunca construíu um parque municipal. E veja-se o quanto a cidade se expandiu nos últimos 50 anos.
A Câmara Municipal das Caldas da Rainha nada entende da lógica que suporta o Termalismo, que precisa de amplos espaços verdes para a protecção dos aquíferos termais e para os rituais de terapia e lazer próprios dos aquistas e de uma estância termal digna desse nome. Lembro que apenas comigo na vereação foi aprovado o Perímetro de Protecção Termal que estava pendente há anos.
A Câmara Municipal das Caldas da Rainha é insensível ao aspecto distintivo e competivo que seria salvaguardar o conjunto termal das Caldas da Rainha e classificá-lo, pelo menos, como monumento nacional, proposta que enderecei, em 2002, ao ex-IPPAR, mas que, depois de 2005, nada foi feito pela autarquia para tal se concretizar.
Noutras cidades e noutros países, há bons exemplos de gestão participada de territórios. Em nada semelhante aos meros jogos de posse.

2010-06-08

As Termas da Ferraria no dia da reabertura


Vista geral das Termas da Ferraria. Uma das imagens recebidas do meu colega arquitecto Manuel Saldanha, por ocasião do dia da reabertura deste balneário termal na ilha de S. Miguel (Açores), numa manifestação de grande apreço por parte da população local.

2010-06-06

Termas da Ferraria

Imagem: Pormenor da página 429 do livro O Desenho das Termas, com perspectiva virtual do plano geral de remodelação e requalificação da Termas da Ferraria, 2003, arquitectos Manuel Saldanha (coord.), José Capela e Paulo Monteiro

Neste fim-de-semana, reabriram as Termas da Ferraria, localizadas na ilha de S. Miguel (Açores).
Tal como expressamos no nosso livro dedicado à Arquitectura Termal, "o plano integra a remodelação do antigo edifício das termas, reconvertendo-o para restaurante-bar e criação de um Spa, bem como piscinas exteriores projectadas por uma equipa externa ao coordenador do plano.
A intervenção no edifício balnear preexistente passou pela ampliação em cave, única
possível. Desenvolveu-se, assim, o programa em três cotas, permitindo a separação e autonomia de actividades distintas – Spa/piscina interior, restaurante-bar e apartamentos – e a manutenção de entrada única para todas elas, que distribui, de nível, para o bar imediatamente fronteiro, com comunicação directa com essa e sequencialmente para o restaurante e, via escada e elevador, para o Spa. Os materiais preconizados para a construção e acabamento desta área recorrem a soluções baseadas em estruturas porticadas e/ou maciças em betão armado, compartimentos individuais em pedra regional, madeiras maciças, alvenarias e lâminas de vidro, apontando-se para todas as serralharias, vãos e cubas a utilização de aço inox para ambientes marítimos.
O projecto para as piscinas exteriores, dos arquitectos José Capela e Paulo Monteiro, que o plano geral integra, prevê, para além destas, uma nova construção de apoio, para
a qual é escavado o solo onde se integra o edifício em forma de L, nada se elevando, portanto, acima da cota de soleira da casa preexistente, excluindo a guarda de protecção. Num dos tramos do L, integram-se as duas piscinas e o solário e, no outro, o corpo serpenteado de vestiários, balneários e instalações sanitárias de apoio, para além de uma esplanada. Neste último tramo, paralelo às curvas de nível, existe um túnel coberto pelo prolongamento da cota de assentamento do antigo balneário. O corpo serpenteado divide as zonas de pés sujos e pés limpos, abrindo-se para ambos, tendo no extremo um bar voltado para as piscinas, com esplanada anexa.
Este corpo tem uma pele dupla: uma exterior, de policarbonato transparente, e uma interior, opaca, que encerra individualmente cada um dos compartimentos. Instalado nos interstícios formados, tanto entre as duas peles, como entre os vários compartimentos, o sistema infra-estrutural é visível e inclui a iluminação dos espaços do túnel. Deste modo, o volume de equipamentos funciona, na sua globalidade, como caixa-de-luz.
Em termos exteriores, o projecto de paisagismo [da autoria da arquitecta paisagista Marta Lourenço] que integra o plano geral coordenado pelo arquitecto Manuel Saldanha propõe que o utente possa usufruir de vários elementos que o espaço oferece: o edifício de restaurante e Spa, um espaço de estada e a zona balnear com equipamentos de apoio." (in PINTO, Helena Gonçalves; MANGORRINHA, Jorge, O Desenho das Termas. História da Arquitectura Termal Portuguesa, 2009, pp. 316, 318).

Águas de Esperança

Recebeste um banho quente
não de águas, mas dessa gente
estendida mão em confiança.

Tens um sonho, uma ambição
de, num passo de campeão,
tornar Tormenta em Boa Esperança.

(Jorge Mangorrinha, 6 de Junho de 2010,
a propósito da chegada da selecção nacional de futebol à Africa do Sul)

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